O teatro é vida, como o movimento é vida. Em “Verdade ou Consequência?” Sofia Marques parte em busca do seu amigo e actor Luis Miguel Cintra; e Cintra em busca de si mesmo, ambos escavando a matéria e a memória do teatro, a matéria e a memória da vida. Em casa, rodeado de estatuária e do seu Porto, junto ao mar e na Espanha onde nasceu, num palco de luz e sombras, nos filmes de Manoel de Oliveira ou nos poemas de Ruy Belo.

Nota de Intenções

Depois das minhas anteriores experiências com filmes documentais, apercebo-me dos seus traços comuns: projectos de artistas e pessoas que admiro, que me parecem importantes serem registados e apresentados. A vontade de desenvolver um novo projecto com o Luis Miguel Cintra surgiu após um momento muito particular e delicado tanto para ele como para mim: o encerramento do Teatro da Cornucópia. Para ele, 44 anos de experiência, trabalho, dedicação... um projecto de vida. Para mim, posso dizer que foi o projecto da minha vida. Por estas razões e mais algumas, encontro um Luis Miguel Cintra que reflete sobre o que fez, o que ainda poderá fazer e o que ainda quer fazer.

Já tinha tido a experiência de documentar o seu trabalho no meu último filme “Ilusão”, a partir do espectáculo Ilusão, com não actores e onde revelei muito do funcionamento da companhia do Teatro da Cornucópia e dele como encenador num projecto tão distinto do que até então estaria habituado a fazer. Uma viagem contagiada pela poesia do Lorca, a música do Falla e os cenários da Cristina Reis.

Agora a viagem é outra. É uma viagem pessoal, em torno de uma das pessoas mais importantes e queridas da minha vida. Mas em simultâneo, uma viagem universal, já que a nível cultural, social e político, Luis Miguel Cintra é reconhecido como de uma importância imensa para a cultura deste país. Actor de teatro e cinema, fundador de uma das companhias de teatro mais importantes e interessantes em Portugal, encenador de teatro e de ópera e recitador, entre muitas coisas. Se no teatro deixou a sua marca, no cinema impôs a sua presença em dezenas e dezenas de filmes portugueses e não só.

Dou por mim à procura do Luis Miguel Cintra do passado, o Luis Miguel Cintra único, e encontro momentaneamente um Luis Miguel Cintra em conflito com o seu Eu. Eu própria dou por mim a passar por esse processo. Percebo que tenho alguma resistência em receber este Luis Miguel Cintra que aparece momentaneamente porque estou presa numa imagem do passado. Percebo que não existe sintonia nesta procura, ou seja, eu procuro o Luis Miguel Cintra a quem sempre tive acesso, e o próprio procura um outro diferente dele e da imagem que fazem dele, para poder aguentar a vida nova que se apresenta.

Costuma muitas vezes dizer que inventei este filme para criar uma nova forma de relacionamento com ele. Talvez seja verdade, mas a realidade é que sinto um privilégio ao estar perto dele, ao escutar o que me diz, ao ver o que vê. É esse privilégio que quero partilhar com este filme.